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Falhas nos centros de saúde obrigam utentes a pagar contracetivos

Devido à subida dos preços destes produtos, os concursos públicos têm vindo a ficar vazios por falta de propostas, atrasando a aquisição centralizada e a distribuição.

As falhas nos stocks de pílulas e outros métodos contracetivos nos centros de saúde estão a acontecer com frequência, obrigando as utentes a recorrer às farmácias ou a adiar a colocação dos dispositivos que evitam gravidezes indesejadas. O problema ocorre um pouco por todo o país, com particular incidência em Lisboa e Vale do Tejo, noticia esta segunda-feira o Jornal de Notícias (JN).

“Este ano tem havido falhas no fornecimento”, nomeadamente na pílula prescrita para as mães que estão a amamentar e nos Dispositivos Intra-uterinos (DIU), resume Diogo Urjais, vice-presidente da Associação Nacional de Unidades de Saúde Familiar ao JN.

O também enfermeiro de família numa unidade de cuidados primários em Leiria assegura que as “intermitências” nos fornecimentos se devem a atrasos nos concursos e são transversais a todo o país. Quando as utentes chegam ao centro de saúde e não há a pílula que estão a tomar, a solução é “levarem uma receita para comprar na farmácia”. Nestes casos, são obrigadas a suportar uma parte dos custos porque a comparticipação é de 69%. Quando a mulher opta por um dispositivo, como o DIU, e não há, “temos de atrasar a aplicação”.

Ao JN, a ARS de Lisboa e Vale do Tejo explica que, por um lado, há um aumento do consumo dos medicamentos, incluindo dos produtos farmacêuticos anticoncecionais, relacionado com a retoma da actividade assistencial, e foram necessárias aquisições adicionais. “Sendo um processo centralizado na SPMS [Serviços Partilhados do Ministério da Saúde] e de cariz nacional, acarreta, necessariamente, períodos de execução mais longos”, refere, ao JN.

Por outro lado, o aumento dos preços dos medicamentos provocou atrasos nas compras. “Para cada posição deserta por falta de propostas aos preços habituais, a SPMS deve solicitar a cada ARS a disponibilidade para aumentar o seu cabimento e, posteriormente, voltar a lançar o concurso”, adianta.

“Falham todas as pílulas”
Adelina Valfreixo sente as dificuldades diariamente. “Temos grandes falhas na quantidade de contracetivos. Falham todas as pílulas, mas sobretudo a da amamentação, que está em ruptura desde o final do ano passado”, explicou ao JN a enfermeira de família do ACES de Sintra, um dos maiores agrupamentos de centros de saúde do país. “O que fazemos é perguntar logo à utente se tem possibilidade de comprar o contracetivo na farmácia com receita. Se não tiver, fica limitada ao que há em stock”, diz a também dirigente do Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor).

À Associação para o Planeamento da Família (APF) chegam queixas que condizem com os relatos dos enfermeiros. “Temos algumas mulheres que nos contactam preocupadas pelo facto de a pílula disponibilizada no centro de saúde mudar frequentemente, o que as deixa inseguras face a possíveis alterações no seu organismo e mesmo com dúvidas se a eficácia se mantém”, nota Paula Pinto.

A responsável da APF relata ainda casos, “menos frequentes”, de mulheres que utilizam o implante ou o Sistema Intra-uterino (SIU) que contactam a associação “preocupadas porque o prazo de validade do seu método terminou” e foram informadas de que terão de aguardar uns meses pela consulta.

Clara Azevedo, enfermeira de família e dirigente do Sindicato dos Enfermeiros, refere que “por questões de sustentabilidade e redução do desperdício”, os stocks de contraceptivos são pequenos. No ACES Póvoa de Varzim/Vila do Conde, onde trabalha, não há “neste momento qualquer ruptura”.

A presidente da Sociedade Portuguesa de Contraceção, Teresa Bombas, é cautelosa. Diz que tem conhecimento de algumas falhas de stock nos centros de saúde, mas não consegue dizer se é um problema generalizado. “A disponibilidade de contracetivos nos cuidados primários também está dependente dos pedidos que estes fazem e da forma como calculam as necessidades”, afirma Teresa Bombas. E acrescenta: “O que nos parece mais preocupante é a dificuldade de acesso às consultas de planeamento familiar nos cuidados primários e hospitalares.”

Apesar de tudo, a médica recorda que, segundo o Atlas de Contraceção (um estudo europeu sobre métodos anticoncecionais), Portugal é dos países com mais contracetivos gratuitos ou comparticipados.

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