A lenda do fantasma da estação de São Bento no Porto
Será que este fantasma ainda percorre a estação de São Bento?
A actual Estação Ferroviária de S. Bento ocupa o espaço resultante da demolição do Convento de S. Bento da Ave-Maria no Largo de S. Bento (actual Praça de Almeida Garrett).
No início do século XVI, o rei D. Manuel I, mandou construir à custa de sua fazenda, o Mosteiro da Ave-Maria ou da Encarnação das monjas de São Bento, dentro dos muros da cidade, no local chamado das Hortas do Bispo ou da Cividade que foi inaugurado no dia de Reis do ano de 1535.
As religiosas deste convento eram, portanto, beneditinas.
O Convento da Ave-Maria era selectivo e só mulheres com alguma condição ali entravam, sobretudo nobres. Muitas pessoas ali quiseram recolher familiares, mas por falta de estatuto social não eram aceites.
Em vários romances é relatada essa condição, por exemplo na Consolação, de Camilo. No convento da Ave-Maria organizavam-se muitos eventos e festas sociais que permitiram a muitas mulheres ali internadas encontrar marido. A algumas festas chamavam de Rapiocas (daí o termo Rapioqueiro).
De três em três anos, quando da eleição das novas abadessas, realizavam-se os chamados Outeiros ou Abadessados para os quais eram convidados familiares e amigos das freiras e internas, figuras da sociedade e poetas famosos desse tempo. Eram uma espécie de serões culturais, que duravam três noites e terminavam altas horas da madrugada.
A eles assistiam muitas pessoas e sobressaíam poetas repentistas. Camilo, Guerra Junqueiro, Xavier de Novais, Alberto Pimentel, Guilherme Braga e tantos outros eram costumeiros destas diversões.
Em 1834 sai o decreto de extinção das ordens religiosas em Portugal, façanha de Joaquim de António de Aguiar, mais conhecido por “mata frades”.
Esse famoso decreto decretava a extinção imediata das ordens masculinas (e confiscação das suas propriedades), a proibição de que novas freiras professassem os seus votos e a extinção dos conventos por morte da última freira que lá residisse nesse ano.
A portaria governamental que mandava demolir o convento das freiras beneditinas de S. Bento da Ave Maria, fundado por D. Manuel I, no século XV, numas antigas hortas do bispo, para no seu lugar se construir a estação central dos caminhos-de-ferro da cidade, foi publicada em 5 de Novembro de 1888.
Ainda nesse ano, engenheiros e pessoal das Obras Públicas “invadiram” a clausura e começaram a tirar medidas com o propósito de dar início aos trabalhos de demolição. O mosteiro ainda estava habitado. À frente dos funcionários apareceu uma abadessa que lhes disse de forma calma e serena: “podem tomar quantas medidas quiserem que o convento não vai a terra enquanto aqui houver religiosas; temos muita fé no nosso patriarca S. Bento que nos ouve e o milagre vai acontecer: ou o ministro morre ou cai o ministério…”
O ministro que era o Emídio Navarro não morreu, mas demitiu-se dias depois da pasta das Obras Públicas. O convento só começou a ser arrasado após a morte, em 17 de Maio de 1892, da última abadessa, D. Maria da Glória Dias Guimarães.
A partir daí as instalações começaram a ficar devolutas, abrindo então caminho para a construção da estação de São Bento.
As imagens da imponente igreja foram adornar altares de outros templos; a confraria do Senhor do Bonfim comprou o órgão; e os ossos das religiosas, que jaziam debaixo do soalho da igreja e sob o lajedo do claustro, foram levados para um sarcófago no cemitério do prado do Repouso que ficou assinalado com um belíssimo pórtico manuelino, velha relíquia salva da construção do tempo de D. Manuel I.
No entanto, ao longo dos anos, subsistem várias histórias, entre as quais de que em certas noites, ainda é possível ouvir as rezas da última abadessa a ecoar pelos corredores das alas da estação!
Será que este fantasma ainda percorre a estação de São Bento?
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